sábado, 24 de maio de 2008
TÁ DOIDÃO TIO!
quarta-feira, 7 de maio de 2008
PÁGINA EM BRANCO
Phillip Glass enche meus ouvidos com suas melodias. À minha direita uma janela aberta para uma noite sem estrelas. No chão, o ventilador gira as pás e joga um pouco de vento agitando os cabelos que restam. Das estantes os livros observam o clarão do monitor que, lentamente, linha após linha, é preenchido por palavras. Escrever é um ato solitário. A vida é uma jornada solitária. Mesmo convivendo com seis bilhões de humanos arrastamo-nos como moluscos, sem conseguir abandonar a segurança da casa que carregamos e que pesa cada vez mais à medida que a preenchemos com nossos falsos conceitos do que deve ser a vida. Arrastamos séculos de idéias prontas e preconceitos. Alguns de nós lemos centenas ou até milhares de livros, participamos de seminários, de grandes debates de idéias, elaboramos teorias, imaginamos soluções para tudo, mas eis que um dia, ou quem sabe uma noite, sentados em algum canto, abrimos as mãos e as vemos vazias, tudo eram apenas cinzas da fogueira que nos consome e, agora, são espalhadas pela ventania do tempo que tudo arrasta consigo.
Enquanto digito meus questionamentos vejo que dois milhões de visitantes foram atraídos ao Festival da Neve de Sapporo, no Japão.
Nós passamos. Esquecemos. Aprendemos tão pouco.
Passamos e deixamos uma grande página em branco...
terça-feira, 6 de maio de 2008
ÀS MARGENS DO ITAPOCU
(Publicado no livro "Crônicas Jaraguaenses" - design editora - 2007)
O mundo chora Pavarotti. Sento à margem do Itapocu, cercado de Jaraguá. Ouço, vindo de uma janela da casa do outro lado do rio, Torna a Surriento, na forte voz do tenor. O céu está azul, um vento suave roça meus cabelos e as primeiras andorinhas brincam sobre as águas, prenúncio da primavera que se aproxima. Alguns canários ensaiam os primeiros trinados, mas, a cada primavera que se aproxima, o mundo fica mais pobre, pois lhe faltam vozes para cantar a força da vida, faltam águas ao rio que expõem as pedras nuas. As águas que trouxeram os primeiros colonizadores há muito evaporaram e suas canoas permanecem nos sonhos e nos quadros da Arlete. O mesmo rio que um dia refletiu Emílio, o homem que escreveu a história dos que aqui chegaram, carrega hoje o lixo que descartamos às suas margens. Fernando Pessoa amava o rio que passava por sua aldeia e o achava mais belo que o Tejo, apenas por ser o rio que passava por sua aldeia. E nós, amamos o rio que passa por nossa aldeia, a progressista e bela aldeia que construímos no vale? Pavarotti agora canta Mamma e pela janela que solta sua voz esvoaça uma branca cortina de renda. A casa do outro lado do rio é uma casa de sonho, ainda não foi atingida pelo corre-corre dos turnos das fábricas que a cercam, nem embarcou nos apressados ônibus que despejam multidões de operários bocejantes às portas das indústrias. Uma garça branca pousa numa pedra, lá longe, quase na curva do rio, e vista daqui parece uma frágil bandeira pedindo uma trégua. Funiculi-Funiculá, meus ouvidos viajam e os olhos procuram por dançarinos no ar, mas o que vejo é o vento levando uma folha de jornal por sobre o gramado, notícias de ontem que serão esquecidas amanhã. Fecho os olhos e me transporto para um outro tempo, tempo em que os bugres pescavam nas águas desse mesmo rio e nós nem sabemos como o chamavam. Depois vieram os bugreiros, com suas armas de fogo e com seu medo, abrindo estradas, construindo casas, a mata dando lugar aos pastos e às roças. Os bugres que não foram caçados sumiram na mata sem deixar vestígios. O rio que tudo espelha, mas não tem memória, também os esqueceu. Abro os olhos e já não há mais rio, nem Pavarotti, pela janela vejo que já escureceu. Ouço agora um canto vindo lá de Guaramirim. Ou será minha loucura? Aqualung, do Jethro Tull, na voz do Tiago. Duas lágrimas caem no teclado. Já não sei por quem choro: Pavarotti, rio Itapocu ou por mim mesmo. Meus dedos viajam sobre o teclado. Já é sete de setembro e o Carlos está calvo de me pedir para cumprir o prazo na entrega da crônica...
domingo, 4 de maio de 2008
POEMA SEM LEI
Palavras sem nexo
talvez,
mas quentes
como um beijo,
fortes
como um abraço,
acolhedoras
como um útero,
venenosas
como uma serpente.
Manchetes de jornal
em tipos-sangue,
tipos grafi-pavor,
horror-realidade,
fatalidades,
destino inconsciente
de quem se diz racional.
Mas há palavras, sim,
traçadas no rosto,
esculpidas nos calos,
assim como um membro
teso,
preso entre as cochas,
arrebentando a carne,
num geme-sorriso
de quem não quer
mas pede mais.
Num ejacular constante
de palavras,
cuja forma e cor
não mudam,
poeta após poeta
enchem linhas
com frases mágicas,
trágicas.
Frases proscritas são ditas,
dia-a-dia,
no prostíbulo humano.
É foda
bater ponto,
enfrentar filas,
julgar sendo julgado
pelo mais vil dos pensadores.
A caixa registradora
computando fracassos,
o caixa-deus
traçando destinos
de homens numerados,
programados, racionais.
A mão sagrada
apertando teclas,
apalpando seios,
coçando pentelhos,
disparando bombas,
pedindo clemência
e escrevendo versos.
A boca torcida
pedindo carícias,
falando besteiras,
soltando a língua,
procurando a vagina,
mas também
piedosa,
clamando as graças
da Virgem Santa
aos pés de uma prostituta.
O humor negro
nos pensamentos,
decepando crianças,
estuprando freiras,
matando de fome,
congelando grávidas
esperanças
de um amanhã sem medo.
Mas é preciso escrever
mais,
sempre mais,
até que cada célula
tenha como núcleo uma mensagem.
É preciso se recompor
a cada bomba,
juntar cada pedaço,
voltar à caverna,
respirar a água feito um peixe,
e a vida
qual feixe de luz
atravessando tudo,
revivendo cada átomo.
sábado, 3 de maio de 2008
BATALHA
Carros posicionados. Homens prontos para canhonear. Cavalos relincham nervosos, lançam jatos de vapor no ar gelado. Espadas desembainhadas emitem reflexos prateados. Silêncio total. Olhos fixos no horizonte procuram o inimigo invisível. Tambores mudos aguardam o sinal do ataque. O sol alto não aquece, apenas ilumina. O general cai do cavalo e acorda assustado. Debate-se entre os lençóis. Um filete de suor frio nas costas. Não está só. Ouve a respiração do corpo que dorme ao lado. Os passos das sentinelas no pátio do quartel o devolvem à realidade. Os números esverdeados do relógio marcam quatro horas. Falta uma hora para começar o dia. A cabeça está confusa. Há cães ladrando distantes, fora dos muros. A cabeça quase explode e lhe relembra várias garrafas de vinho. Na névoa das recordações um rosto quer se mostrar. Não tem coragem para encará-lo. Sente-se nu. Lutou mil batalhas, mas sente que perderá essa. Falta-lhe coragem para encarar o outro lado da cama. Desfilam em sua cabeça batalhões de soldados rasos. Seus filhos, suas crianças. Quer levantar e acender a luz. O corpo não obedece. O coração dispara descompassado. A mão tateia, procura. Quando toca na pele macia o coração tambor dá a última batida. Fim da batalha. Mergulha nas trevas iluminadas. Um soldado acorda assustado. Veste a farda e sai cabisbaixo do dormitório...
COMPOSIÇÕES MUSICAIS
Letra: Gil Salomon
Música em parceria com Cícero Jerônimo da Silva
Arranjo: Tiago Wickmann
SONHO
Garganta seca
Areia nos olhos
Cadeira caída
Estrela cadente
A última
Néon no shopping
Pegadas no deserto
Xampu para cabelos ressecados
Água-miragem
Bolsa arrancada
Boca famélica
Batom rubro
Calcinhas roubadas
Cueca virada
Orelha de gato
Sonho de valsa
Viena desencantada
Dois mil e um
Odisséia
Zaratustra
Sem platéia
Nietzche no altar
Milagre
Pescador sem sandálias
Salada de hibiscos
Prato rachado
Mesa sem toalha
Criança largada
Sacada inocente
Multidão
Cabeça sem cérebro
Cama vazia
Coberta largada
Lençol freático
Água parada
Desejo proibido
Sonho erótico
Corpo estendido
Caixão esquecido
Mármore
Cinzel largado
Aleijadinho
Ouro preto
Ladeiras
Panela no fogo
Senzala lacrada
Pelourinho
Seios desnudos
Sangue escorrendo
Câmaras de gás
Coca cola
Pipoca
Pica-pau
Matinê
Ejaculação precoce
Mão na virilha
Culpa
Prazer
Pecado
Lazer
Chuva de outono
Águas de maio
Barco que afunda
Vestido de chita
Flutuando vermelho
Sonho sem lógica
Ordeno ao cérebro
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